segunda-feira, março 06, 2006

O fascínio da rima

Gostaria de partilhar convosco uma experiência curiosa de tradução que, apesar da brevidade do enunciado nos pode conduzir a uma reflexão sobre as liberdades que o tradutor pode (ou não) tomar. Num contexto de tradução de textos turísticos de português para alemão, tinha de traduzir as palavras do imortal Eça de Queiroz acerca do Queijo Rabaçal, definido pelo autor como "redondo e divinal". Ao transpor para Alemão, comecei obviamente pela tradução de "redondo" por"rund". Fui subitamente levada de "rund" para "gesund" que me fulminou pela rima apetecível. E, como se não bastasse, ocorreu-me a tão germânica palavra "echt", ou seja, na versão alemã das palavras de Eça, o Queijo Rabaçal seria "echt rund und gesund". Perdeu-se a menção às qualidades divinas do queijo, mas ganhou-se uma maior proximidade do leitor alemão que porventura se irá sentir tentado a provar o delicioso queijo! Tratando-se de textos turísticos, a ênfase tem de ser necessariamente colocada no destinatário da mensagem, devendo o tradutor adoptar e adaptar-se aos moldes da língua e cultura de chegada, mesmo que isso implique uma certa "desvirtuação" do texto original. O objectivo de quem traduz textos turísticos de português para outras línguas (sendo que, na maior parte dos casos, esses textos são tão barrocos e intrincados, "tipicamente portugueses") deverá consistir em atrair o seu leitor, munindo-se de todas as ferramentas possíveis para tornar os enunciados inteligíveis na sua língua. Evitam-se, assim, labirintos de frases intermináveis, que, à boa maneira portuguesa, apenas servem para evidenciar o leque de vocabulário e a destreza sintáctica do emissor. A mensagem tem de ser clara, objectiva e depurada de divagações poéticas.
É, sem dúvida, muito difícil traduzir para uma língua que não é a nossa, no entanto devemos encarar esse facto como um estímulo, um ímpeto à tradução, que se torna um desafio tanto mais enriquecedor! É um caminho tortuoso que reclama uma pesquisa incessante ("googlando", obviamente), um contacto permanente com a outra língua (televisão, imprensa, filmes, etc.), para que ela se torne mais próxima e que habite em nós.
Eça que me perdoe! Não pude resistir à rima!

1 Comments:

Blogger Peter Hanenberg said...

A solução que encontrou é "redondo e divinal"!

1:08 da tarde  

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